DANDO VIDA PRAS PAREDES NA CAPITAL PARANAENSE

Deá pousa pra foto em frente a parede que aplicou o grafiato

Quando eu desembarquei na rodoviária de Curitiba meu primo Deá já estava esperando. Meu primo nasceu Ademir Rodrigues de Oliveira, na favela do Jd. Paraná em Foz do Iguaçu, há 32 anos atrás, e ganhou o apelido de Ade na sua infância; não gostou do apelido e inverteu, ficando "Deá", como é conhecido até hoje. No percurso até a Vila Reno, que fica nas proximidades de São José dos Pinhais o assunto foi só um: "pintura". Há dois anos e meio Deá abandonou o trabalho de operador de empilhadeira num mercado para começar a trabalhar em uma obra como auxiliar de pintor. Hoje o seu registro na carteira de trabalho já consta como Pintor e o primo tem muita história pra contar nessas andanças colorindo paredes de apartamentos, comércios, prédios e casas. "Hoje o grafiato, a textura e o projetado está dominando", afirma Deá, falando sobre as novas tendências e tecnicas de pintura, enquanto mostra o grafiato de cor marrom que fez na parede do seu quarto. Tentando me convencer a ficar em Curitiba para trabalhar junto com ele o primo disse a respeito de seu trabalho: "Hoje o que eu mais gosto de fazer é dar vida pras paredes". Falou que só deixa desse trabalho se conseguir fazer um curso tecnico na area de segurança do trabalho e ingressar nessa área. Deá também almeja no futuro montar sua propria empresa de pintura, a qual ele já pensou até no nome: "DEARTE PINTURAS".

A convite do primo fui aprender um pouco de pintura nos ultimos quatro dias que estive em Curitiba. Embarcamos no ônibus Vila Reno ás 6:15hs da manhã com destino a Tamandaré para fazer um grafiato na casa de um mestre de obras. "Você começou bem, direto no grafiato, eu quando comecei foi lixando parede, numa mão uma lâmpada e na outra uma lixa", ironizou o primo, contando o segredo de uma parede bem lixada, acender uma lâmpada bem perto da parede para perceber os erros. "Eu tinha um chefe que vinha circulando com um lápis os erros na parede, se o pião fosse ruim de lixa a parede ficava igual um dálmata".

O meu primo me mostrou com todo cuidado o processo de se aplicar um grafiato: Passar a espátula para tirar os excessos no reboco, isolar os cantos das janelas e portas, tirar o nível para fazer a fita, colocar um papelão no chão para não sujar toda a casa, passar o selador, aplicar o grafiato, riscar, entre muitos outros macetes. Eu e meu primo sempre fomos parceiros de trampo e de correria de grana. Na nossa infância começamos catando materiais recicláveis nas ruas do Jd. Petrópolis e Vila A; já vendemos gelinho, pastel, picolé; trabalhamos na feira; trabalhamos empacotando carvão; descarregando caminhão de laranja no CEASA; ajudante de pedreiro; na colheita de algodão; cortando grama; trabalhamos num depósito no Paraguai; cuidando de carro num mercado no centro; entre muitos outros corres. Depois meu primo mudou-se para Curitiba, onde já está há 15 anos e já trampou em dezenas de outros serviços.

Terminado a primeira parede perguntei pro primo se o serviço estava bem feito, ele olhou pra minha roupa e disse: "Sua roupa tá muito limpa, tem que se sujar mais, quando você tiver se sujando mais, aí vai tá ficando bom". Disse que os amigos zuam com ele por conta da calça toda suja de tinta: "Eles perguntam: você pinta casa ou pinta calça? Mas, pintor que não se suja de tinta não é pintor". Gostei do trampo de pintura, onde boa parte dos contratos são feitos por empreita e o pintor faz seu ritmo e seu horário. Com o programa "Minha Casa, minha Vida" - que por aqui apelidaram de "Minha Casa, Minha Vida / Minha Vida Toda Pagando" - cresceu o mercado da construção civil e junto com ele o da pintura. Depois da insistência do Deá, aceitei o desafio e vou passar uma temporada na Capital para me aperfeiçoar.

Eu que já estou há algum tempo dando vida pras palavras, agora vou começar a dar vida pras paredes.